Andre Pita

Repetir ou não repetir a PNA? Eis a questão... - Parte 1

O período após a PNA é pautado por um misto de emoções. Por um lado, ficamos felizes por ter ultrapassado o suplício e queremos festejar. Por outro, não conseguimos ultrapassar a pequena voz na nossa cabeça que nos deixa dúvidas sobre a nossa posição e o que devemos fazer a seguir. O percurso de cada um é diferente e deve ser aquele que melhor se adapta aos nossos objetivos.

     Olá, chamo-me André Pita e realizei a PNA em 2020 e em 2021. A minha preparação foi feita tanto em contexto pré como pós-pandemia e tive que me adaptar da melhor forma que consegui à falta de estágios e a estudar o dia todo em casa. Durante a fase inicial do estudo, aquando do 1º confinamento, tive uma grande dificuldade em manter-me motivado, o que acabou por se refletir numa falta de organização eficaz do meu tempo. Achei que o melhor uso das minhas horas de estudo seria rever repetidamente matéria e adotei um estudo passivo. Negligenciei a realização de perguntas por medo de errar ou de fazer perguntas de temas que não tinha revisto. Entrei numa espiral de receio e insegurança. Rapidamente comecei a ponderar repetir o exame ainda antes de o fazer e a desistir desde muito cedo. Os últimos meses antes da prova foram passados a questionar se a deveria sequer fazer. Acabei por fazê-la, mas se já antes considerava que ia repetir, após a prova a certeza acumulou-se e nem fui capaz de aproveitar os dias de descanso merecidos.

     Passei os primeiros meses após a prova a questionar-me sobre o melhor percurso a tomar. Quando começamos o internato queremos ajudar, queremos aprender e aproveitar ao máximo e pode ser difícil saber como gerir o nosso tempo e aliá-lo ao estudo. Procurei ocupar-me com tudo o que me impedia de pensar na prova e na decisão que tinha pela frente. Iniciei o meu ano de IFG em Medicina Interna, em pleno pico pandémico, e foi difícil de gerir com o estudo, de tal forma que acabei por decidir completar o estágio mas rescindir contrato logo de seguida. Atirei-me de cabeça para o internato e acabei por rapidamente entrar em burnout e perceber que aquela não era a mentalidade certa e que apenas estava a adiar o inevitável.

     A decisão de rescindir e voltar a casa para estudar foi das mais difíceis que tomei pois implicou abdicar de uma nota e de uma posição e lançar-me de novo ao desconhecido. Olhando para trás consigo perceber o que fiz mal, mas infelizmente não tinha com quem falar sobre as minhas dúvidas. Naquela altura apenas me sentia perdido, sem saber o que fazer. Procurava sobretudo saber que não estava sozinho, pois foi duro tomar esta decisão enquanto os meus colegas prosseguiam com as suas vidas e eu parecia que só andava para trás. Muito do que deixo escrito neste artigo são coisas que gostava que alguém me tivesse dito antes de pensar sequer em repetir e espero sinceramente que vos sejam úteis.

Saibam aquilo que vos motiva para repetir o exame

    Antes de decidir voltar a estudar, perguntei-me várias vezes qual era o meu motivo para querer repetir a PNA. Achar a resposta concreta demorou algum tempo. No fundo sabia que aquilo que eu queria era ter liberdade de escolha entre as várias especialidades que me via a exercer e, na minha posição, não tinha nenhuma disponível. Ponderei muito manter a minha nota e aceitar uma especialidade qualquer, mas não estaria a ser honesto comigo se o fizesse.

    A nota desiludiu-me bastante, senti que lutei tanto, enfrentei várias adversidades, e não o vi refletido na minha posição. Sabia os vários erros que tinha cometido e que encarei a prova de forma totalmente errada. No entanto, o enorme rombo na minha autoestima e na confiança nas minhas capacidades acabaram por ser outro grande motivador. Queria corrigir os erros do passado e tentar recuperar alguma confiança em mim, mesmo sabendo que repetir a prova não equivale a uma melhor nota ou posição. Sempre preferi arriscar e aprender com o erro do que viver na dúvida de qual seria o resultado se o tivesse feito. No fim, aquilo que mais importa é que sejamos felizes com as nossas escolhas, sem arrependimentos.

Todos percorremos o mesmo caminho, se bem que por percursos diferentes. Não deixem que o percurso dos outros vos afaste do vosso.

Pensem sobre quais são as vossas especialidades de eleição

     Mas ainda assim havia uma questão importante a esclarecer - seria mesmo útil repetir a PNA e arriscar-me a ficar pior posicionado? Esta dúvida manteve-se ao longo de toda a minha preparação para repetir a prova e ainda hoje acho que foi a mais complicada de responder.

     Eu sabia as especialidades que gostaria de escolher, mas também sabia qual era a minha especialidade de eleição. A dura realidade da prova levou-me a alargar o horizonte das minhas escolhas ao repetir e convenci-me de que se não ficasse na especialidade de eleição também não seria o fim do mundo. Falando com vários internos de especialidade, apercebi-me que a escolha é apenas um passo. Mesmo não ficando na primeira opção, encontraremos algo que nos seduz em cada uma delas e quando formos especialistas a dúvida sobre se a escolha foi a melhor ou não será já algo vago e distante.

     Devem fazer uma lista das especialidades e dos locais onde gostariam de trabalhar ainda antes de sair a vossa nota oficial e posição. Usem o tempo que passam no hospital durante os primeiros meses do internato para contactar com o maior número de especialidades que consigam. Façam e refaçam a vossa lista de acordo com o que vão conhecendo de cada especialidade, para que, assim que a vossa posição seja lançada, possam comparar com a das escolhas do ano anterior e ver quais ainda teriam disponíveis para escolher em Novembro.

Procurem entender o que é que faltou na vossa preparação para a PNA anterior

     Aquilo que me apercebi ao reler a matéria foi que as bases teóricas não eram o meu ponto mais fraco, mas sim saber aliar a quantidade abismal de matéria com a compreensão do que era perguntado nas várias questões da prova. Mais do que querer saber tudo, temos que procurar colocar-nos no lugar de quem escreve as questões e qual o objetivo educacional que aquela pergunta tem em mente. A minha maior falha foi mesmo a pouca quantidade de perguntas que respondi ao longo da preparação e então foi nesse aspeto que me foquei quando voltei a estudar.

     Para outros, será rever a matéria de forma mais organizada, aprender a separar a informação essencial do que é supérfluo, e criar uma base sólida de informação. Pode ser difícil saber o que é que faltou quando nos aplicamos tanto e pensamos ter um bom método de estudo mas os resultados não surgiram. Procurem entender o que falhou:
  • Se foi saber a matéria, foquem-se em ser objetivos nas revisões do que sabem e gastar mais algum tempo no que não estava tão bem consolidado.
  • Se foi terem feito poucas perguntas, façam algumas sempre que têm tempo e procurem discuti-las com colegas do estágio;
  • Se foi por falta de organização, gastem algum do vosso tempo antes de começar o estudo a organizar o vosso dia consoante os horários que têm disponíveis. Há sempre medo de não dedicar tempo suficiente ao estudo, mas mais vezes o que nos falha é descansar e dormir - que são alturas essenciais para cimentar conhecimento - do que propriamente a falta de estudo.

     Aqui deixo algumas das minhas recomendações pessoais: usem ao máximo os recursos que têm disponíveis - sejam eles os learning cards da Amboss, livros de preparação como o First Aid ou até lerem os sumários do UpToDate acerca da matéria em estudo. Façam muitas perguntas, de preferência de bancos conhecidos e peer-reviewed, e procurem ver se o recurso a flashcards funciona para vocês, em que podem tanto criar os vossos decks como usar pré-feitos. Se há algum objetivo educacional ou informação de que se esquecem frequentemente, os flashcards são uma ótima forma de as memorizar através da spaced repetition. Tanto as perguntas com os flashcards são excelentes ferramentas que priorizaram um estudo mais ativo. E se não se conseguem focar a estudar, tentem o método Pomodoro e vejam se se adequa ao vosso método de estudo. Estudem onde se sintam confortáveis e tenham o mínimo de distrações ao vosso redor.

Não procurem reinventar a roda, joguem sempre com os vossos pontos fortes e confiem no vosso método. Mas se for preciso, não tenham medo de mudar e integrar alternativas novas.

A decisão de aliar o estudo à realização do IFG ou rescindir o contrato deve ser bem ponderada e é uma decisão individual

     Durante o estágio de Medicina Interna pouco ou nada consegui estudar ou sequer organizar o meu estudo de forma útil. As horas eram imensas, o trabalho acumulava-se e os dias de urgência caóticos não tinham fim à vista. Tentei aproveitar os tempos livres ou mais parados na enfermaria para responder a algumas perguntas ou rever alguns slides sobre os casos que via diariamente na enfermaria. Mas todos os dias chegava a casa exausto e sem vontade de estudar, ao que se acrescia a noção de que no dia seguinte teria que repetir toda aquela rotina. Após a publicação da lista oficial, tomei consciência que teria que decidir o que fazer a seguir. Na altura senti que não conseguiria continuar a tentar aliar as duas coisas. Precisava de algum tempo para descansar antes de reiniciar o estudo e que, se o meu foco era a prova, então queria dedicar-me totalmente.

     Não obstante da minha decisão, é possível conciliar o estudo com o IFG e têm a vantagem de contactar com várias especialidades e colocar em prática o vosso conhecimento - houve várias perguntas que sabia a resposta por me lembrar dos casos vistos nas urgências ou nas enfermarias. Se virem que são capazes de gerir o vosso tempo de trabalho e de estudo ou que têm outras razões para se manter no IFG façam-no, não será o que vos impedirá de conseguir melhores resultados. Usem os tempos de estágio mais leves para compensar os mais stressantes e adquirir uma rotina e um método que vos mantenha motivados e focados.

     Caso rescindam, vão ter que conviver com essa decisão e saber que, uma vez tomada, será difícil voltar atrás. Os meus pais avisaram-me que estava a abdicar de uma vaga por uma incerteza, mas eu sabia que não seria capaz de lidar com o “e se eu repetir e for melhor?” e decidi regressar ao estudo. Sei que foi um tiro no escuro, mas não me arrependo de o ter feito, tivesse ou não uma melhor posição. Cumpri o meu objetivo, enfrentei os meus medos e acreditei de novo em mim. Tudo se faz, somos capazes de muito mais do que aquilo a que nos damos crédito. Confiem em vocês e nas vossas escolhas e sigam-nas até ao fim.

     Tomem a decisão que vos deixa mais confortáveis com a vossa consciência, mesmo que não seja a decisão mais fácil de tomar ou parecida com a dos outros.

Objetivo Educacional

  • Um dos maiores conselhos que vos posso deixar é que aprendemos mais com os nossos erros do que com os sucessos - “If at first you don't succeed try, try and try again”.
  • Saibam aquilo que vos motiva para repetir o exame ou para se manterem a realizar o IFG e quais as vossas especialidades de eleição.
  • Mantenham a vossa nota em perspetiva. A nota não define nada sobre vocês, nem sobre aquilo de que são capazes. Celebrem cada vitória por mais pequena que ela pareça.

Créditos

  • André Pita
  • David Meireles
  • Inês Gueifão
  • João Nuno Soares
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